A síntese de sua individualidade nem mesmo esta cidade pode revelá-la de todo, dando-se a conhecer de modo a que não lhe faltem previsões sobre seus tropos de
cólera e de sua lavoura arcaica, dos aquedutos e de seus ovos futuristas, com o fito, talvez, de rebocá-la para um local de ganhos inauditos e vestir-lhe alguma indumentária mais ancha, ou mais breve. Duma jangada de pedra lhe veio algo, e assim se viu real estrada, reflexos do grande b/arco incipiente.
Nunca vencida em seu tempo de contentamento, a cidade em questão continua gerando e
gerindo o assombro a quantos lhe entrem através seja da serra, do mar ou do ar, ainda sem saber que, entre o temível bafo da razão e o sabor amaro da desrazão, ela, a cidade, passeia e faz lastro ao riso, mesmo que em todos os cartórios e tribunais as ancas do Tempo estejam no limiar do impossível, enquanto a glote do medo assenhora-se tanto das praias e praças quanto das criaturas que nela perpassam sua bossa em busca do mais descansado rumor.
A dor morará nos museus.
Na palma da mão, um cão soergue o que não há de bisonho no Homem, alça uma pata ao afago do calçadão sobre e a partir do qual a antiga suicidade ou monstrópole resolveu acudir a si mesma, sentindo que na calma de um não se pode ver o colostro, desviado, fluir para longe da dignidade perene que a sua finalidade exige. Execráveis bitáculas
empunham o dia, e veneráveis padarias se abrem para que o cisco solar lhes entre de sobejo com a trilha do mar sendo festa de abricós, mangueiras e castanheiras.
Ainda hoje, às vezes, receio que a Cidade Maravilhosa maravilhas não nos possa mais mostrar, como uma boa velhinha trazendo petiscos aos netos e netas (não a velhinha avarenta que libertou o jovem Raskolnikov). Ledo muxoxo, engano.
A dor morará em museus, e, parece, mas a cidade do Rio de Janeiro permite isso.
7 Comments:
M. said...
Que post sublime! Amei isso!
Silvia Chueire said...
Belo post mesmo!
Silvia
Anônimo said...
Sépala da mais bela flor.
Rio de Janeiro, na visão de alguém que enxerga além da mediocridade cotidiana.
Muito belo o texto.
Abraços.
Zana said...
Este blog é muito legal. Gostei da idéia!
Excelente texto, Darlan! Poético, realista!
Parabéns!
;)
Anônimo said...
Uma obra admirável esta crônica sobre a cidade maravilhosa.Pétalas que formam o calice das flores..ou uma monstrópole que resolve acudir a si mesma...que merece perene dignidade, mas maravilhosa cidade que maravilhas já não nos pode mostrar...Sendo assim a dor morará em museus...
Darlam é um craque da literatura, eu nem teria palavras capazes de comentar seu texto, por isto o plágio de partes dele...
Aplausos amigo.
Darlan M Cunha said...
É isso aí, caro DONINI
que, mineiro como eu, sabe que o inventário do Rio de Janeiro também é o nosso inventário.
Abraço.
DARLAN
Darlan M Cunha said...
REVISITEI, hoje, dia 10 de outubro de 2008, suas Páginas, doce LI.
***
Longa vida para ti, ELIANE STODUCTO, que tão bem a tantos, e a mim também, fizeste.
Descanse.
Darlan M Cunha
(Belo Horizonte, MG)
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